Crédito: sxc.hu
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Os preços dos imóveis estão nas alturas e está cada vez mais difícil
adquirir a casa própria sem precisar recorrer a longos financiamentos.
Para entender o mercado atual, um pouco de história se faz necessário.
Os recursos para financiamento na construção civil eram praticamente
inexistentes até a década de 60. A partir de meados dessa década, até
o final da década de 70, foram tomadas as primeiras medidas de
incentivo ao crédito imobiliário no país. Foi o chamado milagre
econômico. |
O começo da década de 80 foi marcado pelo início dos problemas que afetariam a economia como um todo. A inflação disparou e o resultado foi o aumento na inadimplência dos financiamentos, fato que impactou negativamente as instituições financeiras que concediam crédito. O milagre econômico dava lugar à década perdida.
A entrada nos anos 90 foi igualmente desestimulante para o mercado. Com as altas taxas de juros e inadimplência, que acabaram por espantar as instituições financeiras do setor, coube às próprias construtoras e incorporadoras financiarem seus clientes.
Observe que o risco de inadimplência seria todo, ou quase todo, das construtoras. Afinal, os bancos demonstravam cada vez menos interesse em financiar esse tipo de aquisição. As construtoras precisavam ter lucro, mas não poderiam exagerar, sob pena de perder negócios. Isso fazia com que o preço dos imóveis fosse bem mais próximo de um valor justo do que o que vemos atualmente.
Com a implantação do Plano Real em 1994, e com o início do sistema de metas de inflação em 1999, a economia começou a se estabilizar. O começo dos anos 2000 foi conturbado, com algumas crises financeiras, o atentado terrorista nos EUA e as eleições presidenciais no Brasil.
Em 2004, com os níveis de inflação mais sob controle, iniciou-se o processo de retomada dos financiamentos para as construtoras. Além da melhora na economia, outros pontos foram cruciais para que o setor financeiro se sentisse mais confortável em voltar a conceder crédito. O regime do patrimônio de afetação, que segrega cada empreendimento imobiliário das demais operações das incorporadoras, e a consolidação da alienação fiduciária, que agilizou o processo de retomada de imóveis, que antes chegava a demorar anos, foram alguns deles.
Repare que com a retomada do crédito para as construtoras, a maior parte do risco de inadimplência nas operações financeiras volta para os bancos e instituições do setor.
Ao perceber isso, as construtoras resolveram aproveitar para alavancar seus lucros. Mas como fariam? De duas maneiras. A primeira seria buscar dinheiro barato no mercado financeiro por meio de IPOs (abertura de capital) para rechear seus caixas. A segunda seria elevando os preços das novas unidades que passariam a lançar.
O ano de 2005 foi marcado pelo IPO da construtora Cyrela, que acabou por servir de locomotiva para que uma enxurrada de outras construtoras também abrisse seu capital. Só em 2007 foram cerca de quatorze. O setor, que antes era tipicamente regionalizado, passou por um processo de nacionalização.
Nesse ponto, você deve estar se perguntando por que antes as construtoras praticavam um preço mais justo, e ainda assim se satisfaziam com o lucro obtido, e a partir da segunda metade dos anos 2000 passaram a elevar muito seus preços? Lei da oferta e da procura? Talvez. Ganância? Provavelmente sim.
Se os preços por metro quadrado da construção, já incluindo o terreno, na maior parte das regiões metropolitanas pode variar de R$1.500 a R$2.500, por que vemos lançamentos imobiliários partindo de R$5.000, R$6.000 e as vezes ultrapassando a barreira dos dois dígitos? Fome por lucros?
Parece que o pensamento por trás de tais ações passa por imaginar até onde o bolso do brasileiro é capaz de aguentar sem "estourar". Parece que estão procurando extrair o máximo que conseguirem das famílias desavisadas, cujo único sonho é conquistar a casa própria. E tudo bem se essas famílias não conseguirem honrar seus longos financiamentos no futuro. O risco agora é quase todo dos bancos, lembra? Afinal, em caso de inadimplência, a retomada dos imóveis atualmente é bem mais fácil e desburocratizada. Os bancos agradecem.
Vale ressaltar que as famílias possuem parte da culpa (mesmo que intrínseca) nesse fenômeno, pois foram seduzidas pela abundante oferta de crédito e também pelo poderoso marketing das incorporadoras. Não se assuste se após a leitura deste artigo você começar a pensar que a lei da oferta e da procura, no que tange à procura, foi algo impulsionado por esses dois mecanismos. Bingo!
Abaixo, dois gráficos ilustram a explosão de aquisições decorrentes da retomada do crédito no Brasil. Os dados são do SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo).
Os números são referentes apenas a aquisições. Os dados de construções foram eliminados, pois quem constrói acaba por pagar um valor mais próximo do preço de custo do imóvel.
Parece sustentável o ritmo de crescimento nos financiamentos? Será que as estatísticas seguirão essa íngreme escalada? Não, uma explosão dessa magnitude não parece sustentável. Observe o próximo gráfico de aquisições de imóveis novos. Parece que o apetite por esse tipo de moradia tem demonstrado que a escalada não será tão íngreme. Os anos de 2010 e 2011 deram claros sinais disso em relação ao ano de 2009.
Pode-se concluir que o limite parece ser o bolso das famílias e ,como sempre, se algo der errado no meio do caminho, quem sofrerá será o consumidor, que não possui o governo e outras instituições como sócios para salvá-lo em caso de necessidade.
O futuro dirá. Aliás, o presente já diz, pois os últimos dados são de desaquecimento e recuo nas vendas.
E não se espante se começar a ouvir que o setor imobiliário deu um "tiro no próprio pé". A ganância muitas vezes tem essa característica!
Autor: Sinésio Alves